O caso da Americanas continua dando muito pano para manga. Após o escandaloso rombo fiscal, a empresa declara que pedirá recuperação judicial em função de uma dívida que pode chegar a R$ 40 bilhões. Mas todo esse burburinho, que agitou o mercado nos últimos dias, aponta para o papel das auditorias, que são responsáveis por analisar relatórios e apontar possíveis divergências nos números.
Para o CEO da Pact, plataforma de resolução para disputas empresariais e passivos judiciais no Brasil, Lucas Pena há falha de ambos os lados, empresa e auditoria. No lado da empresa, o principal desvio, segundo ele, é cultural, com dificuldade dos executivos em lidarem frontalmente com os principais desafios financeiros da companhia e os exporem à liderança executiva. “Do lado da auditoria, certamente há falha na profundidade com que se discutiram temas relevantes com margem interpretativa. Os processos de auditoria são intensos e grande parte do trabalho tem foco operacional e analítico, com pouco espaço para discussão estratégica e identificação de temas relevantes”.
Pena acredita que a reputação da Americanas ficará certamente comprometida, o que fez com que os executivos recém chegados abdicaram de seus cargos. Como já foi instituído um comitê de investigação, a demonstração é de que a empresa vai aplicar suas regras de compliance e seguir as normas estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para esclarecer e corrigir os fatos. “De qualquer forma, os danos de imagem para a empresa e para a auditoria são inegáveis e de longo prazo. Ressalta-se, no entanto, que esse tipo de desvio acaba pressionando todos os pares dessas instituições sobre suas práticas contábeis e de compliance (ex. outras big4 e varejistas)”, observa o CEO.
No que se refere ao trabalho de auditoria, o economista, conselheiro do Conselho Regional de Economia da Bahia (Corecon) e especialista em finanças Lucas Spínola diz que só seria adequado avaliar a atuação da empresa PwC após ter acesso aos papéis de trabalho, pois assim se teria conhecimento de como foi tratada a questão. “É certo que uma situação desta só seria possível com a anuência ou omissão de muita gente. Em geral, casos como estes ocorrem a partir de conluios, envolvendo muitas pessoas e gente com grande poder de decisão”, destaca.
Para ele, o erro contábil era a forma de se contabilizar o que é denominado risco de sacado, que é a movimentação triangular entre uma instituição financeira, a Lojas Americanas e um fornecedor. O fornecedor recebia de forma antecipada através da instituição financeira, por um produto que só iria entregar em um determinado momento futuro. A Lojas Americanas passava a dever ao banco e não ao fornecedor, pagando apenas no momento que recebesse a mercadoria.
“O correto seria de eles reconhecerem o risco de sacado como dívida bancária, e esta dívida tinha uma despesa financeira que deveria constar do demonstrativo de resultado. Mas no caso em questão, eles indicavam como se tivesse devendo aos fornecedores e a parcela da despesa financeira enquadrava como conta redutora da dívida com fornecedores. Algo que não era real, porque a dívida era com o banco e no valor cheio”, explica.