Depois da tempestade de quedas da indústria baiana nos últimos anos, o próximo triênio promete ser de bonança. Essa é a expectativa da gerência de Estudos Técnicos da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), que prevê um desempenho local em consonância com o nacional em 2023, apresentando aumento de 0,3% na atividade industrial. Parece pouco, mas o setor se viu afogado devido às crises políticas e econômicas e agora começa a avistar o horizonte.
Uma das grandes apostas para retomada de fôlego é na economia verde e energia renovável, especialmente pela implantação de unidades da Unipar e Unigel no estado. Mas ainda tem os segmentos da construção, apesar de um movimento de desaceleração com aumento dos juros; o de refino, muito em função da Refinaria de Mataripe, com máxima operação das unidades; o setor químico, que ainda se beneficia da alta nos preços de 2022 e a metalurgia, com destaque negativo por conta do pedido de recuperação judicial da Paranapanema.
Mesmo com a espera dos bons ventos, o superintendente da Fieb Vladson Menezes observa que a Bahia continua apresentando baixa atratividade para novos investimentos. “A importância da industrialização é clara. Basta olhar os empregos gerados pela indústria, que tem muita qualidade. É um setor que tem enorme efeito multiplicador em relação aos outros segmentos, mas precisa de investimentos e de vencer os gargalos, que são muitos”, diz.
Segundo ele, a Bahia tem cerca de 4% da indústria de transformação do país e o maior Polo Petroquímico da América Latina. “O estado é um polo importante, embora não seja grande. Precisamos resolver os gargalos e identificar setores com maior potencial de crescimento. Destaco a energia renovável e economia verde, que vão jogar o estado para um maior desenvolvimento econômicos e social nos próximos anos”.
Em relação ao setor privado, a economista da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais (SEI) Carla Janira Nascimento observa que haverá mais investimentos em energia renovável, a exemplo da eólica, solar, de hidrogênio verde, refino de petróleo, químico, automotivo, mineração, entre outros. “Todos esses são investimentos importantes para o crescimento do emprego, da renda e da produtividade a médio e longo prazo no estado. Recentemente a secretaria divulgou protocolos de intenções para implantação de novos projetos, com geração de 1,5 mil novos postos de trabalho e investimentos previstos da ordem de R$ 8,38 bilhões para os próximos três anos”, ressalta.
De acordo com projeções da SEI, a grande indústria, que agrega a de transformação, extrativa, eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos e construção, deve crescer 1,8% em 2023. Para Carla, isso deve ocorrer em função da melhora na confiança do empresário, que vai impulsionar os investimentos, principalmente em infraestrutura, o que deve contribuir para o crescimento da indústria e da economia baiana nos próximos anos. ”Neste sentido, destaco empreendimentos como a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), a ponte Salvador-Itaparica, o Tramo III da linha do metrô em Salvador e a construção da nova rodoviária de Salvador, como também as obras de saneamento básico”.
Investimentos privados
Mais investimentos, segundo ela, estão no setor de bens de consumo duráveis e não duráveis. No setor de alimentação, a Norsa Refrigerantes S.A. (Coca-Cola), vai ampliar sua atuação em Simões Filho, com investimento de R$245 milhões e geração de 125 empregos. A Mondial Eletrodomésticos, em Conceição do Jacuípe, vai apostar na expansão com investimento de R$ 136 milhões e geração de 1,1 mil empregos, totalizando 4.615 empregos diretos.
“Outro grande investimento esperado, aproveitando o espaço deixado pela Ford, é a instalação da chinesa BYD, para produção de chassis de ônibus e caminhões elétricos, veículos de passeio elétricos e híbridos, além de processar lítio e ferro fosfato, utilizados nas baterias. A expectativa é de investimento de R$ 3 bilhões e geração de 1,2 mil empregos”, disse a economista que ainda aborda os setores estratégicos, como a petroquímica, que pretende fortalecer a cadeia produtiva, visando a modernização das unidades produtivas.
Conforme ela, está prevista a chegada, na Bahia, da primeira fábrica de hidrogênio e amônia verde do Brasil, em Camaçari. A Acelen, por exemplo, que é proprietária da refinaria Mataripe, já está investindo em modernização e revitalização para aumento na capacidade produtiva da refinaria e diversificação da sua linha de produção. “O estado tem 327 empreendimentos incentivados em implantação, prevendo um investimento de quase R$ 108 bilhões e a criação de aproximadamente 26 mil vagas de emprego até 2030, em várias atividades industriais e nos diversos territórios de identidade”, completa.
Gargalos
O principal gargalo do setor industrial na Bahia é infraestrutura, como afirma o superintendente da Fieb Vladson Menezes. De acordo com ele, existem problemas de todas as ordens. “Como boa parte do que é fabricado na Bahia é vendido nos estados do Sudeste, já que nos especializamos em bens intermediários, a infraestrutura de escoamento se torna muito importante. Aí tenho que falar da deficiência das rodovias, como a BR-101, que está duplicada no país todo, menos na Bahia. Se olhar a ferrovia, que é mais importante para as distancias maiores, a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) tem sérios problemas. A quantidade de carga não chega a 1 milhão de toneladas E não é por que não existe carga, mas pelas condições da ferrovia que são muito precários, com velocidade média de 11km por hora. Precisamos resolver esse problema. Mas temos problemas também com os portos, que não tem ligação com as ferrovias”.
Menezes destaca esses como os principais, mas elenca outros problemas enfrentados pelo setor, como a falta de infraestrutura de linhas de transmissão, assim como a questão dos distritos industrias. “Quando uma empresa quer investir na Bahia não consegue ter a propriedade do terreno, ela só terá a concessão e isso dificulta para financiamento bancário, por exemplo. Então há vários assuntos para serem resolvidos ainda”.
Unigel e Unipar
A Bahia continua atraindo investimentos no segmento de geração de energia eólica e solar, aproveitando suas condições naturais. De acordo com a economista da SEI, Carla Janira, há grande expectativa sobre a conclusão e início das operações da Unigel, que será a primeira fábrica de Hidrogênio Verde do Brasil, em 2023.
Segundo ela, a Unigel, que foi fundada em 1966, está estrategicamente localizada no Brasil, nos Estados da Bahia, Sergipe e São Paulo. Tem posição de liderança em estirênicos, acrílicos e fertilizantes nitrogenados se consolidando como uma das maiores empresas químicas da América Latina e a maior fabricante de fertilizantes nitrogenados do país. “A Unigel entrou há alguns anos no mercado de fertilizantes, operando unidades que foram fechadas pela Petrobras. A empresa já produzia sulfato de amônia. Hoje é pioneira em um mercado-chave para projetos industriais de hidrogênio verde devido à alta capacidade de energia renovável instalada no Brasil”, disse Carla.
A empresa está investindo US$120 milhões (R$650 milhões) na construção da maior fábrica de hidrogênio verde do Brasil. A planta deve entrar em operação até o final de 2023. Nesta ocasião, o projeto integrado de hidrogênio verde e de amônia verde deverá ser o maior do mundo, conforme a economista. A companhia ainda conta com a tecnologia líder mundial para eletrólise de alta eficiência da thyssenkrupp nucera, da Alemanha.
Localizada no Polo Industrial de Camaçari (BA), a nova fábrica, em sua primeira fase, terá capacidade de produção de 10 mil toneladas/ano de hidrogênio verde e de 60 mil toneladas/ano de amônia verde, voltada para o mercado doméstico. Na segunda fase do projeto, prevista para entrar em operação até 2025, a companhia deve quadruplicar a produção de hidrogênio e amônia verdes.
Já a Unipar é fabricante de cloro-soda, derivados de soda e PVC e parceira da AES Brasil no Complexo Eólico Tucano no nordeste do estado, onde está sendo concluído o parque eólico, com capacidade para a geração de 155 megawatts por ano. O projeto eólico adota a premissa de mão de obra local, cerca de 200 pessoas, sendo a maioria de mulher. A operação gerou outras demandas, que movimenta a economia local, como a necessidade de serviços, como o de creche, sendo que fez um acordo com a prefeitura de Caldas do Jorro e atualmente 150 crianças entre zero e 3 anos estão em período integral.
O foco na autoprodução de energia elétrica com uso de fontes renováveis (solar e eólica), propõe reduzir a pegada de carbono e ainda contribuir para a excelência operacional e a confiabilidade das plantas. “A previsão é de que o Campo Eólico Tucano esteja em operação em 2023 e gere cerca de mil novos postos de trabalho. Além da produção de energia, a Unipar construirá, partindo do zero, uma unidade de cloro-soda no estado. A fábrica será construída no Polo Petroquímico de Camaçari, para atender à demanda crescente da região por ácido clorídrico, hipoclorito de sódio e soda cáustica. A tecnologia utilizada é a de membrana, mais moderna que existe no setor, e vai gerar durante o processo hidrogênio verde, o que permitirá a otimização do consumo de energia e dos demais recursos. O objetivo da empresa é usar o hidrogênio verde para produzir ácido clorídrico, para atender as demandas do Marco do Saneamento no Nordeste. A expectativa é de que a nova unidade entre em operação em 2024”, completa Carla.
Balanço 2022
Arrefecido, o setor industrial baiano acumula resultados negativos consecutivos desde agosto último. Ainda assim, a Federação das Indústrias do Estado da Bahia estima que a produção deve fechar o ano com crescimento de 5%, em um movimento de recuperação após quase três anos de expressivo declínio, tendo queda de 14,3% em 2021, de acordo com a pesquisa Industrial Mensal – Pessoa Física (PIM-PF), do IBGE.
Os empregos formais gerados pela indústria baiana vêm crescendo desde 2020 e devem fechar o ano com crescimento de 12,7%, puxado pelas áreas de Construção Civil e Calçados. Em 2023, esses segmentos devem continuar empregando, embora em ritmo menos acentuado.
Em 2022, no acumulado do ano até setembro, a grande indústria baiana já cresceu 3,5%. Contribuíram para esse desempenho, de acordo com as estimativas das Contas Regionais da SEI, o crescimento da indústria de transformação (2,1%), construção (4,5%) e eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos (11,0%). A indústria extrativa registrou queda de 10,5% no período.
Cenário nacional
De acordo com as projeções setoriais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o PIB da Indústria deve crescer 0,8% em 2023. Já o PIB da Indústria da Transformação deve aumentar +0,3% e o da Indústria da Construção Civil deve subir 2,0% no próximo ano.
Com um cenário nacional complicado, o próximo governo vai enfrentar alta nas taxas de juros, alto déficit nominal, elevada dívida pública, índice ainda alto de desemprego, incertezas fiscais e instabilidade política. “O futuro governo terá um início de mandato difícil, com a necessidade de arrumar a casa e conter gastos. Por conta desses fatores, espera-se crescimento muito baixo em 2023 (+0,75%)”, finaliza Menezes.