Na região do Vale do Rio São Francisco, a fruticultura irrigada convive com a regionalidade dos sabores da caatinga, gerando um panorama propício ao surgimento de novos negócios. Nesse cenário, pesquisadores da Embrapa Semiárido (PE) agregaram valor à produção de frutas da região usando o sabor exótico do umbu, o azedo do maracujá-do-mato e o doce da manga.
Eles desenvolveram produtos como a geleia de manga enriquecida com fibras solúveis, o fermentado de maracujá da Caatinga e o doce de umbu, cujo processo de fabricação foi padronizado. Esses ativos, que serão apresentados durante o 5º Workshop Nichos de Mercado para o Setor Agroindustrial (veja quadro), estão em fase-piloto e a Embrapa procura parcerias técnico-financeiras para testar as formulações em escala industrial.
Por trás desses produtos existe um amplo trabalho de pesquisa, que envolve o estímulo ao consumo e a formação de mercados, para a inserção competitiva da fruticultura regional e de seus subprodutos. O esforço engloba a produção industrial e a agroindústria familiar.
Doce de umbu padronizado e sem corantes
O umbu é um fruto da caatinga que apresenta sabor exótico, levemente azedo, sendo apreciado para consumo in natura ou beneficiado na produção de polpas e doces. Apesar de bastante utilizado por pequenas agroindústrias, ainda existem limitações na fabricação de seus derivados, principalmente pela pouca padronização de cor, sabor e textura.
Após diversos testes, a Embrapa conseguiu desenvolver uma formulação de doce de umbu com parâmetros de qualidade controlados, coloração mais atrativa e diminuição da sinérese, que é a liberação de líquidos na superfície do doce, o que dá aspecto de melado.
“Chegamos a uma receita que favorece o sabor pronunciado da fruta e apresenta redução de 25,6% no teor de açúcar”, destaca Clívia Castro, uma das pesquisadoras responsáveis pelos experimentos. Outra vantagem é que a formulação não utiliza conservantes, corantes e aromatizantes. O produto pode ser comercialização como doce de corte ou recheio na área de panificação. A cientista afirma que ele amplia as possibilidades de aproveitamento pós-colheita do umbu, apresenta apelo regional e fortalece a agricultura familiar do Semiárido.
“Vinho” de maracujá-do-mato
O fermentado de maracujá-do-mato ou da caatinga é uma bebida alcoólica com propriedades físico-químicas e sensoriais parecidas com as do vinho branco. Apresenta aroma exótico, lembrando o fruto fresco, além de compostos com propriedades antioxidantes, relata a pesquisadora Aline Biasoto, que desenvolveu o produto.
O processo de obtenção da bebida foi concluído em condições controladas, recebendo boa avaliação em teste que envolveu 120 consumidores de bebidas alcóolicas. Segundo a pesquisadora, a ideia foi elaborar uma formulação de fermentado para ser aplicada à cultivar BRS Sertão Forte, lançada em 2016 pela Embrapa.
Especialista na área de enologia, Biasoto explica que o produto está em fase de aprimoramento da formulação para ser tornar mais atrativo ao mercado, sendo uma alternativa de beneficiamento e agregação de valor para a cadeia produtiva do maracujá da Caatinga.
“Estamos buscando, por exemplo, determinar o melhor estádio de maturação do fruto para a preparação do produto, ou seja, se é mais indicado usar o maracujá em seu estádio de vez ou maduro, bem como a melhor proporção para diluição entre polpa e água, além de testes com insumos enológicos permitidos pela legislação para bebidas elaboradas em sistema orgânico de produção”, comenta.
Ele também pode servir como base para a elaboração de outras bebidas, como o fermentado gaseificado de maracujá. “É um mercado promissor, que atende a demanda por bebidas alcoólicas de melhor qualidade e aroma e sabor exóticos”, completa.
Geleia de manga enriquecida com fibras solúveis
O objetivo da pesquisa desenvolvida no Laboratório de Processamento de Alimentos da Embrapa Semiárido foi elaborar uma geleia mais saudável, que unisse o sabor da manga à crescente demanda da população por produtos com menor teor de açúcar.
Para isso, foi testada a substituição de parte do açúcar utilizado na fabricação por frutooligossacarídeos (FOS), prebióticos de alto poder adoçante que se enquadram na definição de fibras solúveis, explica Ana Cecilia Rybka, pesquisadora responsável pelo ativo.
“Os frutooligossacarídeos são açúcares não convencionais, não metabolizados pelo organismo humano e não calóricos. Essas características fazem com que os FOS promovam uma série de benefícios à saúde humana, principalmente em relação à regulação intestinal”, declara a cientista da Embrapa.
A variedade de manga escolhida foi a Kent, por apresentar ótimo potencial de processamento, polpa macia e adocicada quando madura. Na primeira fase do trabalho, chegou-se a 11 formulações de geleias com diferentes concentrações de frutooligossacarídeos. Nessa etapa, foram realizadas análises sensoriais com diversos públicos.
“A geleia com baixos teores de sacarose e com quantidades maiores de FOS (12%) foi bem aceita, mostrando que é viável realizar essa substituição”, destaca Rybka. De acordo com a pesquisadora, a próxima fase envolve as avaliações de custos, estabilidade e validade das geleias. O intuito é selecionar, entre as formulações desenvolvidas, aquela mais indicada para a produção comercial.
Além da geleia, o produto também pode ser utilizado como recheios para biscoitos e bolos. O esperado é que o ativo impacte positivamente a cadeia produtiva da manga devido ao destaque de alimento funcional e promotor da saúde.