Iarodi D. Bezerra*
Em janeiro vivenciei um evento incrível ao tirar férias de 30 dias corridos. Pode parecer bobagem para você, leitor, mas para mim foi um momento histórico. No primeiro dia, acordei muito feliz, a ponto de escutar a voz de de Neal Armstrong narrando sua célebre frase como se eu estivesse em uma cena de filme:
“…esse é um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade”.
Sempre me programei para tirar férias, mas nunca acontecia. Qual a dificuldade em parar, afinal? Criava milhões de desculpas dias antes como: “Olha, fulano está em crise, precisarei atendê-lo!”, “As contas não irão fechar, não posso parar de atender!”, e assim, cheio de justificativas, não tirava as minhas folgas.
A verdade nua e crua é que eram puro boicote para que eu não parasse de atender. “Parar”,inconscientemente, nunca foi meta para mim…até que veio a pandemia. Mergulhei no trabalho como se não houvesse amanhã e o resultado veio da pior forma: sobrepeso, hérnia, ossos deteriorados, ansiedade e afastamento significativo da família. E de repente, uma mensagem com uma forte luz neon iluminando apareceu: VOCÊ PRECISA DE PAUSAS!
As pausas são necessárias para o pleno funcionamento da engrenagem do universo. Observe a sua volta, como as pausas se revelam. A dramática pausa após o rasgo luminoso de um raio no céu, vem após o som estrondoso da trovoada. Contemple uma composição musical, onde a importância das pausas produz lindas melodias e canções. E o parto? As pausas entre um urro e outro permite que a mãe respire, descanse e renove suas forças para depois convidar para fora o seu tesouro.
As pausas são necessárias para o pleno funcionamento da engrenagem do universo. Observe a sua volta, como as pausas se revelam
Já imaginou como seria um texto sem vírgulas? Seria uma trem descarrilado e você não entenderia nada. Então, elas oferecem ao leitor paradas breves, permitindo-o respirar e comprender o sentido à oração. Marlon, um amigo, fez uma crítica construtiva sobre o uso excessivo de vírgulas em meus textos. Respondi que tenho fascínio pelas pequenas minhocas e, que por isso as colocava em tudo, no início da frase, no meio ou final; ou então entre as letras ou sílabas, como faço como farinha na lasanha.
Contudo, o mundo veloz nos tem tirado a prazer do parar e sentir as coisas boas da vida. Já dormimos atrasados no acordar do dia seguinte, atropelando o bom dia, o sentar para tomar café da manhã, encher os pulmões com ar puro. Corremos pelas ruas apinhadas de gente também com pressa. Almoço nem se fala. Pega menino doze e trinta, enfrenta trânsito e puff…já está em cima da hora para voltar à seara.
O relógio em seu braço segue em seu ritmo manhoso, marcando o tempo. Mas nós, o aceleramos. E, enquanto não confrontamos essa postura, levaremos as nossas vidas de maneira desreguladas. Sem o silêncio após os raios, nem a composição melódica, nem seguramos um momento de dor para parar, respirar e voltar à luta pela vida. Estaremos sempre esgotados, recorrendo a remedinhos para desacelerar. E é por isso, meu amigo Marlon, que precisamos de vírgulas.
Iarodi D. Bezerra
Psicoterapeuta – Escritor
@iarodibezerra